29 outubro 2006

Privatização parte 2 - a menor eficiência das estatais

Continuando a série, este é o artigo de Maílson da Nóbrega no blog do Noblat em 22 de outubro, sobre estatais e eficiência.

Existe empresa estatal eficiente?
Maílson da Nóbrega

Por definição, uma empresa estatal não tem a mesma eficiência que exibiria se fosse privada. Sua governança corporativa pode até aproximá-la do padrão de gestão privada, como se vê no mundo desenvolvido, mas isso é muito difícil de acontecer em países como o Brasil.
No sistema capitalista, a lógica da empresa privada é a da maximização dos lucros, cabendo ao Estado a defesa da concorrência. Como a missão básica dos administradores é gerar valor para o acionista, há incentivos para que busquem a eficiência e a satisfação do consumidor.
Ainda que adotem estratégia semelhante, os gestores da estatal não dispõem dos mesmos incentivos. Sua lógica é a das políticas públicas, o que pode levá-la a operar sob margens de contribuição negativas, situação inaceitável em uma empresa privada.
A estatal brasileira incorre em custos de transação inexistentes no setor privado. Sua diretoria é substituída a cada troca de governo, o que pode gerar onerosas mudanças administrativas. Submete-se à fiscalização do Tribunal de Contas. Tem que prestar informações adicionais às previstas na lei societária. Seus investimentos dependem de aprovação do Congresso, o que gera incertezas ausentes na empresa privada.

A estatal está sujeita à lei de licitações públicas. Concorrências para compra de bens essenciais como máquinas e computadores costumam ser impugnadas no Judiciário pelos perdedores. São comuns longas demoras para completar o respectivo processo. Gastos de publicidade que interessam mais ao governo são costumeiros na estatal, que também despende recursos em programas sociais com fins políticos.

A eficiência menor da estatal pode acontecer até na Europa, onde há boa governança corporativa. Veja-se o caso da Airbus, que tem participação minoritária da França, da Alemanha e da Espanha. Por pressões políticas, possui fábricas em 16 lugares para gerar emprego em diferentes países.
Uma parte da fuselagem do novo avião A380 foi feita na Alemanha e outra na França, mas as fiações nelas contidas não se encaixaram. Haverá demora de pelo menos dois anos na entrega das encomendas, acarretando prejuízos de US$ 6 bilhões. A Airbus anunciou que fará demissões para vencer a crise.
A estatal brasileira está sujeita a erros semelhantes, mas raramente tem condições políticas para fazer demissões, o que a impede de agir preventivamente como a Airbus.

Também há empresa privada ineficiente, mas ela quebra se não se ajustar e a conta vai para o acionista privado. A estatal não quebra e as perdas vão para o Tesouro. O ônus da sua salvação recai proporcionalmente mais sobre os pobres. De fato, 48% da renda de quem ganha até dois salários mínimos é gasta em tributos. Quem ganha mais de 30 salários paga apenas 23%.
Duas provas inequívocas da menor eficiência da estatal são a Embraer e a Vale do Rio Doce. Há outros bons exemplos, como o da telefonia, mas esses dois estão no imaginário como “transferência do patrimônio da Nação” em condições tidas como tenebrosas. Ambas eram vistas como eficientes quando estavam sob controle do Estado. Depois de privatizadas, multiplicaram várias vezes os investimentos, o recolhimento de tributos, as exportações, o emprego e a geração de renda, embora seus empregados fossem os mesmos da época em que elas eram estatais.
O sucesso das duas empresas derivou em grande parte da eliminação de custos inerentes à sua condição anterior. Seus presidentes são os mesmos desde a privatização.

Estatais são necessárias em certos casos, mas devem ser privatizadas sempre que o setor privado puder substituí-las com vantagens. Mesmo que se justifiquem, valeria estabelecer mecanismos de prestação de contas que permitissem conhecer os custos, para a sociedade, de operá-las segundo os objetivos definidos na lei ou pelo governo da hora.

Nada do que foi dito aqui convence os que defendem as empresas estatais por razões ideológicas. Neste caso, prevalecem mais a visão anticapitalista, a utopia socialista e a correspondente aversão ao lucro. O argumento racional é inútil. Não é a eficiência que importa, mas o ideal estatizante. Avaliar custos e benefícios não preocupa esses grupos.
Em suma, estatais podem ser bem administradas em certos períodos, mas dizer que elas são eficientes como uma empresa privada é um disparate.

Mailson da Nóbrega é ex-ministro da Fazenda e sócio da Tendências Consultoria Integrada

26 outubro 2006

TAM 402 - 10 anos


Arrepiante.

Neste impressionante vídeo do Youtube, é feita uma reconstituição da tragédia do vôo 402 da TAM, em 31 de outubro de 1996. As gravações da caixa preta são sobrepostas às imagens de simulador.

Notar, no canto inferior direito da imagem, as manetes de potência das turbinas. Logo após o avião decolar, a manete direita afunda, pelo mecanismo automático que desliga o motor devido ao reversor acionado em vôo. Os pilotos claramente tentam empurrar a manete para conseguir mais potência, já que a luz que mostraria que o reversor estava acionado não acendeu.

Se a luz acendesse, bastaria deixar o motor se reduzir automaticamente e seguir com um motor só, o que seria possível. Fica demonstrado mais uma vez que uma falha só não derruba um avião. É preciso que haja uma seqüência de falhas para produzir uma tragédia.

22 outubro 2006

Schumacher, Thou Shalt Not Be Forgotten

Imola 1994 (braço erguido, sorriso)
http://www.youtube.com/watch?v=47ccbOpItCg

Adelaide 1994
http://www.youtube.com/watch?v=oQC_LQI1Aiw

Jerez 1997
http://www.youtube.com/watch?v=K2b-gZf70dw

Zeltweg 2002
http://www.youtube.com/watch?v=gdzu-fqrWxQ

Montecarlo 2006
http://www.youtube.com/watch?v=Kb0tyPCGWKY

Brasil, 1991

Neste vídeo do YouTube, com as 10 últimas voltas do GP do Brasil de 1991, dá pra notar pelo som do carro e pelas mãos de Senna que realmente o carro estava com o câmbio gravemente danificado. Nas curvas do Pinheirinho e Bico de pato, principalmente, o carro quase morria. O som do carro logo após a junção também está difenrente, em baixa rotação.

O horroroso Cony



Toda semana eu mentalizo uma postagem detonando a figura ridícula de Carlos Heitor Cony. Uma catarse pessoal, um desabafo para a posteridade. É para isso que serve um "web log", não?

Na solidão em meu carro, correndo pela cidade, às vezes sou exposto pela Rádio CBN ao pavoroso "Liberdade de Expressão", onde dois velhos afeminados falam idiotices sobre assuntos aleatórios. Disfarçam mal seu cubanismo-petista. Vomitam seus preconceitos, mal digeridos após a queda do muro em 1989.

Meus problemas acabaram. O Reinaldo Azevedo fez o melhor artigo já escrito sobre Cony. Vou até buscar mais um pacotinho de amendoim, para reler este texto em grande estilo.

Cony precisa voltar a ser cronista de pet shop

Muitos leitores se perguntam por que Lula está sendo reeleito, mesmo com toda a óbvia roubalheira havida nestes quatro anos. É claro que há razões de ordem econômica — ou paraeconômica. Lula transformou o assistencialismo em máquina eleitoreira. Mas não é só isso. Conta também com prosélitos na classe média, os chamados intelectuais. Dois artigos na Folha de hoje dão conta da delinqüência intelectual que toma conta do debate. Um deles é de Carlos Heitor Cony, de que falo primeiro.

Escreve o homem na página 2: “A questão das privatizações voltou ao debate político, trazida pelo PT, que encontrou em seu adversário eleitoral, o candidato Geraldo Alckmin, um único pecado realmente grave: é do PSDB, partido que no governo desastrado de FHC privatizou empresas e só não vendeu o Pão de Açúcar porque não encontrou comprador. Em principio, não sou contra as privatizações, algumas delas eram necessárias e trouxeram benefícios à economia nacional. Contudo, o processo que presidiu as privatizações foi um escândalo dos maiores de nossa história. Os intermediários, corretores, conselheiros e economistas ganharam fortunas vendendo na bacia da almas alguns nacos do patrimônio nacional.”

Cony tinha uma cadela sobre a qual costumava escrever textos líricos. Infelizmente, a bichinha morreu. Fazendo crônicas para agradar velhinhas de pet shop, ele era bem mais divertido. Chato é que lhe dêem um espaço nobre no jornal — a nobreza possível hoje em dia — para exercer a sua ignorância ligeira. O gracejo sobre o Pão de Açúcar é uma pilantragem intelectual. Isso é que ganhar dinheiro fácil (arte em que Cony é mestre) com imagem vagabunda!

Ah, mas ele não quer parecer um velhinho atrasado! Isso nunca! Não é contra as privatizações — “em princípio”, é claro. Segundo diz, “algumas” (não fala quais) eram necessárias, mas depois fala de escândalos e da venda do patrimônio público “na bacia das almas”. É mentira que as estatais brasileiras tenham sido vendidas a preço baixo. As empresas do sistema Telebrás valiam em bolsa, algum tempo depois, muito menos do que o valor pelo qual foram privatizadas. Ignora-se que, à esteira da privatização, houve investimentos de mais de R$ 100 bilhões, o que não teria acontecido se fossem estatais.

Mas é daí? A especialidade de Cony é fazer prosopopéia sobre cadelinhas. Só escreve sobre privatizações quando está sem assunto e ninguém fez xixi no tapete. Depois Cony se mete a falar de forma desastrada sobre o tamanho da dívida pública, confundindo tudo, com se a venda das estatais é que tivesse sido responsável pelo seu aumento. O raciocínio idiota, dele e de outros que pensam como ele, consiste em supor que o único objetivo da privatização era pagar a dívida. Esse era um efeito secundário. Precisávamos das privatizações para ter investimento. Acho que Cony não adotou nenhuma cadela nova. Cabeça desocupada é a morada do capeta.

Outra coisa: indecente é receber a indenização mensal que ele recebe — próxima de R$ 20 mil, se é que já não foi corrigida — por ter sido uma suposta vítima da ditadura. E não foi só, não, leitor amigo: ele levou ainda R$ 1,5 milhão numa bolada só. Por quê? Ah, porque sua carreira de jornalista teria sido interrompida pelo golpe militar. O jornal em que ele trabalhava não existe mais. Ele foi premiado como se, sem o movimento militar, pudesse ter atingido o topo da carreira: diretor de redação, suponho — duvido que os herdeiros do dono do jornal estejam tão ricos quanto ele. Ah, coitadinho! Cony foi demitido e ficou na rua da amargura, é isso? Que nada! Virou homem forte de Adolfo Bloch, no grupo Manchete, então muito forte, e jamais teve problema para comprar papa fina para suas cadelas. Escrevia crônicas lindas sobre o mármore rosa de sua sala...

referindo-se a casos como o seu, o ministro Gilmar Mendes, do STF, observou que se trata de uma "verdadeira distorção ou patologia, que muito se aproxima de um estelionato". É o que eu também acho. Cony deveria doar a dinheirama do “patrimônio público” aos desdentados e voltar a enganar velhinhas de pet shop com texto sobre cadelinhas amorosas.

Ah, sim: os que não gostarem deste texto tenham a bondade de enviar e-mails de solidariedade pra ele em vez de e-mails de protesto pra mim.

20 outubro 2006

Senna e a bandeira da Áustria


No momento da esperada aposentadoria do Dick Vigarista, nada como lembrar um trecho sobre o melhor de todos, Ayrton Senna. Da Wikipedia:
Talvez a dualidade única de seu caráter ficou mais evidente no momento de sua morte. Enquanto os oficiais de pista examinavam os destroços do carro, eles encontraram enrolada uma bandeira da Áustria, encharcada de sangue. Uma bandeira para ser mostrada na volta da vitória, em homenagem a Roland Ratzenberger, que havia morrido no dia anterior.


Se a tristeza fosse um vídeo, seria este.

14 outubro 2006

Iraque em quadrinhos

Foi publicada pelo Guardian uma impressionante reportagem em quadrinhos feita com dois iraquianos que ficaram trancafiados pelos norte-americanos em 2003.

Claro, o Guardian é uma fonte considerada bem à esquerda no espectro jornalístico, mas é confiável. Até mesmo os jornalistas do próprio Guardian chamam seus leitores "comedores de müsli usuários de chinelos de sândalo". Os ultra-conservadores fãs da FoxNews já disseram que "o Guardian é tão esquerdista que no momento que você o lê, seu pescoço já mostra um princípio de torcicolo para esse lado".

Sou mais o Guardian.

13 outubro 2006

Candidaturas

Prováveis novas candidaturas para os próximos ensaios:

- "Lil´Devil", the Cult
- "Maggie May", Rod Stewart
- "All My Life", Foo Fighters
- "City of Blinding Lights", U2

Escavações arqueológicas em sets passados:
- "21st Century (Digital Boy)", Bad Religion

08 outubro 2006

Privatização: descomplicando para as vítimas da conversa mole do PT

Um texto inicial de Mailson da Nóbrega no blog do Noblat, explicando as mentiras e as idiciotices que se falam sobre o processo de privatização nos anos 90. De tanto o PT e o Requião martelarem, há bastante gente que cai na conversa fiada deles.

Sobre a privatização do BB e de outras estatais

Maílson da Nóbrega

Meu artigo de domingo passado deu o que falar. Mexi em um vespeiro ao levantar a idéia de privatização do Banco do Brasil, mesmo com a ressalva de que se tratava de mera utopia. Recebi elogios, mas também inúmeros e-mails indelicados e insultuosos. Pior, o jornal alterou o título – “O futuro do Banco do Brasil” – para “O fundo do BB”, o que lhe mudou o sentido e ajudou a criar o clima de conspiração. O blog do Noblat, que publica simultaneamente o artigo, manteve o título original.

Para irados missivistas, eu estaria defendendo a entrega do patrimônio da Nação a bancos privados, tal qual teria ocorrido na privatização de estatais como a Vale do Rio Doce. Recorreu-se à linguagem agressiva da época (1984) em que liderei os estudos que culminaram na extinção da “conta de movimento”, pela qual o BB tinha acesso ilimitado aos recursos do Tesouro. Uma campanha insidiosa me atribuiu então o epíteto de “inimigo público nº 1 do BB”. A medida é hoje considerada o ponto inicial da maior evolução institucional das finanças públicas federais. O banco ganhou, pois saiu da acomodação derivada daquele arranjo institucional, mas ainda se acha que o objetivo era destruí-lo.

Ser contra a privatização não é privilégio dos que me enviaram e-mails. Vários estudos mostram uma maioria favorável ao controle, pelo governo, de vastos segmentos da economia, particularmente os “estratégicos”, seja lá o que isso signifique.

Três razões podem explicar essa cultura. A primeira deriva das origens ibéricas da nossa formação. Portugal e Espanha se tornaram potências entre os séculos 15 e 17 graças às conquistas ultramarinas viabilizadas pelo centralismo dos reis absolutos. A atividade econômica básica era exclusividade da coroa. As instituições capitalistas, que transfeririam o cetro de potência para a Holanda, a Inglaterra e os EUA nos séculos três seguintes, somente chegariam àqueles dois países no fim século 20.

A segunda está na justificativa para a ação do Estado nos estágios iniciais do desenvolvimento. O êxito da industrialização da Inglaterra estimulou outros países europeus a seguir-lhe o passo. Como não possuíam as mesmas condições institucionais, recorreram a substitutos estatais, como mostram os estudos de Alexander Gerschenkron. A Alemanha e a França utilizaram o dirigismo, bem como bancos e outras empresas estatais. Depois da Segunda Guerra, teorias do desenvolvimento defenderam o mesmo para os países pobres, incluindo o fechamento da economia para proteger a chamada indústria nascente.

A terceira é uma mistura de ideologia e nacionalismo. Os comunistas apoiaram o dirigismo de Vargas, o precursor do nacional-desenvolvimentismo, porque se coadunava com seus ideais. A esquerda, que confundiu keynesianismo com “desenvolvimentismo”, foi partidária entusiasmada. Os militares viam na intervenção estatal o caminho para viabilizar a produção doméstica de aço e equipamentos militares, tidos como essenciais para a defesa e para fazer do Brasil uma potência. O ideário coincidiu com as estratégias de substituição de importações da Cepal nos anos 1950.

Embora essas idéias sejam de uma época e o nacional-desenvolvimentismo tenha-se esgotado, deixando na sua esteira as bases do processo hiperinflacionário e a maior desigualdade social do planeta, seus pressupostos ainda têm incontáveis adeptos no Brasil.

Em um país no qual o lucro continua sendo visto com suspeição, é óbvio que a privatização não terá aceitação como a dos britânicos a partir dos anos 1980. Mesmo que a venda de nossas estatais tenha sido transparente e exibido erros menores do que os observados em países como o México e o próprio Reino Unido, até hoje se questiona o valor pelo qual elas foram compradas e se duvida da honestidade do processo. O termo “privataria” entrou no nosso imaginário e na linguagem da esquerda, do PT e de tantos quanto se opõem à privatização.

Um grande contingente acredita que as estatais podem promover o desenvolvimento sem preocupar-se com o lucro. Por isso, falar em privatização do BB é como sugerir que ele seja vendido a bancos que agem ao contrário, isto é, querem o lucro, mas não ligam para o desenvolvimento.

No próximo domingo, tentarei mostrar a falácia desse e de outros raciocínios sobre as empresas estatais.

Mailson da Nóbrega é ex-ministro da Fazenda e sócio da Tendências Consultoria Integrada